sexta-feira, 14 de agosto de 2015

O meu Principezinho é Ela, que me cativou para sempre!

Nascemos com duas dezenas de meses de diferença. Separam-nos muitos mais anos do que os que o calendário marca. Eu já nasci velha. Sossegada e com ar sério. Ela há-de ser uma eterna criança. A pular pela casa e a fazer travessuras. A pele atesta-o. Eu sem nenhuma cicatriz, ela com várias marcas de tombos e do mau resultado das tropelias. Partilhamos, entre tantas outras marcas genéticas, aquele tracinho por baixo do nariz que herdámos do pai. Apesar dos olhos castanhos de uma e dos verdes de outra, apesar de uma ser loira e a outra morena, não são raras as pessoas que nos acham parecidas. Finge que a irrita que digam isso. Quando nos dão conta das semelhanças atira sempre com aquele ar pespineto que lhe conhecemos desde que se tem por gente: «Pois sim. Mas eu sou mais bonita!» E é. E mais fashion. E mais mignon, à boa maneira franciú. Como o era a Avó, com quem um dia se vai certamente parecer ainda mais. Para além do físico, dela ficou-lhe também a genica, o carácter buliçoso, o gosto pelo doméstico, a mansidão do trato. Não sei a que lado da família foi buscar o espírito alegre e inquieto. Mas sei que é o que mais a caracteriza. Entre as mais gratas recordações que levarei comigo pela vida contam-se os ataques de riso descontrolado de quando éramos miúdas e tolas. E aquela sensação incrível de que ela enche não só uma sala - à boa maneira das divas de Hollywood - mas uma casa inteira com a sua presença. É um je ne sais quoi que dispõe bem, que alegra e diverte. Serão as vozes em falsete com que teima em responder. Serão as piadas sem graça absolutamente alguma e de que sempre nos rimos que nem parvos que insiste em repetir. Serão as constantes tropelias com que constantemente nos arrelia. Não o saberia dizer. Sei que nos enche a alma e que basta para sermos felizes.

A mana é os Natais da nossa infância. O rebuliço pela casa, a cherviscar todas as divisões até dar com as prendas dias antes da Consoada. A mana é os sorrisos dos meus pais a cada chegada dela, com aquela aura de alegria imensa, que deixa rasto e que fica até muito depois de ela partir. A mana é a alegria juvenil e os risos cristalinos de quem está de bem consigo, de quem agarra a rédea da vida a mãos ambas, de quem ama e se sabe amada. A mana é as nossas lágrimas e o coração escavacado pela morte da Avó. A mana é a vida que se renova, agora a crescer dentro dela. 

Hoje a mana faz anos. Fez-me há tempos o reparo de que escrevo sobre tudo e sobre todos e que nunca ela me mereceu umas linhas. E hoje, por ser um dia especial, que ela tanto aprecia, logo hoje, dou por mim como aqueloutra personagem do Eça, a espremer as ideias até à exaustão e a conseguir apenas umas gotinhas diminutas, que de pouco me valem para lhe fazer o merecido elogio. Não é por nada ter para dizer. É precisamente por tanto haver para dizer sobre quem nos é tudo que é tão difícil deixar escrito quem é ela. Este é, portanto, um post em construção, uma página em aberto, a que hei-de voltar, quando (como amiúde me acontece) der por mim a sorrir sozinha, no meio da rua, ao recordar um qualquer dichote dela ou um episódio caricato. E então, num dia em que as palavras se sobreponham menos aos sentimentos, em que ajudem a decalcá-los em vez disso para este "papel químico", hei-de cá voltar para deixar escrito como deve ser que a minha pessoa preferida sempre foi e sempre há-de ser a minha irmã.