quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Afectos partilhados

Nunca falo com o L. que não me lembre da minha Avó. É um amor que partilhamos. De diferente intensidade, claro, que Avó para ele só a I., a quem venera. Mas ele, como eu, gostava da Avó, da minha. E sempre que estávamos longe perguntávamo-nos como ela ia e aquele que estivesse mais perto passava as impressões da última visita.
 
Não precisamos de dizer o nome. Vem-me à memória instintivamente. Sempre. Um dos dias mais felizes da sua vida coincidiu com um dos mais tristes da minha. Uma semana após a sua morte, no dia em que completaria 90 anos, o L. casou-se e eu estava lá. Apática ainda, a tentar ser feliz com ele e por ele. E fui. Mas sei que as lágrimas que chorámos quando nos abraçámos não foram só de alegria.
 
Nunca falo com ele que não me lembre dela. Não apenas por este afecto em comum, mas por o que ele tem de genuíno, por o que nele é a terra - a nossa terra -, por completar as minhas ideias e frases com provérbios que nos remetem automaticamente para os bancos de pedra com os velhinhos sentados à soalheira, por nos rirmos tanto e tão desbragadamente quando falamos, por sentirmos de ambos as alegrias e conquistas de cada um.
 
Tenho pena que a Avó já não vá conhecer o teu L., que ainda vem a caminho e já te faz tão feliz. Haveria de ficar feliz por ti. Como eu fiquei. Certa de que serás o melhor pai do mundo.

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